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Foto do escritorGeisa Bugs

Referências a partir do Urbanismo Feminista do Coletivo Ponto 6

Atualizado: 12 de mar. de 2021



O livro ‘Urbanismo Feminista: por una transformacion radical de los espacios de vida’ (Col.lectiu Punt 6, 2019), de autoria do Coletivo Ponto 6 (tradução nossa) - uma cooperativa formada por arquitetas, sociólogas e urbanistas, com sede em Barcelona, cuja formação atual é: Roser Casanovas, Adriana Ciacoletto, Marta Fonseca, Sara Ortiz Escalante e Blanca Valdívia - apresenta uma genealogia de décadas de elaboração crítica e experiências práticas que permitem hoje oferecer um contraponto à cidade supostamente neutra. Em linhas gerias, para elas, o urbanismo feminista situa a cidade cotidiana no centro das decisões urbanas para transformar as desigualdes.


O livro está estruturado em sete capítulos, além da introdução, e aqui apresentamos uma tentativa de resenha do segundo, intitulado ‘De quienes hemos aprendido: nuestra genealogía del urbanismo feminista’. Nele, as autoras reclamam a falta de reconhecimento dos aportes feministas à teoria e à prática do urbanismo e apresentam aquelas que são as suas referências. Assim, não é uma lista exaustiva. Neste post, nomeamos algumas destas autoras e suas contribuições, resumidamente. Mais informações e outros nomes podem e devem ser consultados no livro.


Desde os anos 70, aproximadamente, as feministas vêm demonstrando que o urbanismo não é neutro e que é necessário incluir as experiências das mulheres, o que veio a ser chamado de perspectiva de gênero, mais adiante. São da geografia as precursoras dos estudos urbanos feministas, mas também é necessário destacar vozes que tornaram possível que na atualidade essa seja uma questão que cada vez mais desperta interesse. São elas:


ZAIDA MUXI (1964) - arquiteta argentina, fundadora do Coletivo Ponto 6, cujo artigo ‘Cuidad próxima’ (2006) é considerado revolucionário no contexto Espanhol, tanto pela revista em que foi publicado (Ingeneria y territorio) quanto pelo tema. Zaida considera a perspectiva de gênero uma aproximação e não uma disciplina, já que daí elaborou questões relativas ao espaço público, a habitação e a mobilidade, na academia e na prática profissional.


JANES JACOBS (1916 - 2006) - jornalista norte americana, no seu livro ‘Morte e vida das grandes cidades’ (1961) apresentou ideias inovadoras sobre como funcionam, fracassam e evoluem as cidades. Não se sabe se Jacobs se identificava como feminista, mas fato é que a sua reivindicação da rua, das calçadas, dos parques, e do bairro como espaços de socialização, influenciaram o urbanismo feminista de forma decisiva. Ela promoveu elementos, como a alta densidade e o uso misto, que fomentam a rede cotidiana de proximidades e a criação de comunidades de bairro. Por estes e outros motivos, o urbanismo que ela propõe centra as decisões na vida cotidiana das pessoas, tal qual o urbanismo feminista.


DOLORES HAYDEN (1945) - arquiteta e professora norte-americana, tornou-se referência pela análise dos modelos de habitação desde a perspectiva de gênero e sua crítica ao modelo funcionalista de zonificação. Ela recuperou o trabalho das feministas materialistas (meados do século XIX e princípio do XX) que desenharam cooperativas de donas de casa, com cozinhas e creches comunitárias, entre outros elementos - um tanto criticadas por serem soluções para mulheres brancas e de classe média. Escreveu em 1980 um dos artigos mais influentes para o urbanismo feminista: ‘What whould a non sexist city be like?’, no qual faz uma crítica ao subúrbio americano que perpetuou a ideia de que lugar de mulher é em casa, mostrando como o seu desenho teve um impacto negativo na vida das mulheres. Ela propõe um novo paradigma de habitação, bairro e cidade que apoie a vida das mulheres, nomeado HOMES - Homemakers Organization for a More Egalitarian Society.


BEATRIZ COLOMINA (1952) - arquiteta e historiadora de origem espanhola, também estuda as condições de vida no subúrbio. Na obra ‘La dosmesticidad en guerra’ (2007), ela analisa as ferramentas que ressaltam a narrativa sobre a domesticidade, como peças publicitárias e exposições arquitetônicas. Traz, de forma intelectual e acadêmica, uma perspectiva histórica sobre a construção do doméstico que ajuda a entender a relação entre configuração física e social.


GERDA WEKERLE (1947) - professora universitária canadense, aborda a relação entre a segurança das mulheres e o desenho da cidade. Junto com CAROLYN WHITZMAN (uma das maiores experts em segurança das mulheres na cidade) publicou em 1994 ‘Safe Cities: Guidelines for Planning, Design and Management’, focado na configuração física da urbe e como melhorar a percepção de segurança. Ainda que o enfoque pareça por vezes determinista, é um dos textos que mais influenciou o trabalho sobre cidades seguras para as mulheres, tanto no Canadá quanto internacionalmente.


DAPHNE SPAIN (1949) - socióloga norte-americana, analisa desde a década de 1980 o status inferior das mulheres na sociedade. Seus estudos também recuperaram a história de mulheres norte-americanas como construtoras de cidades. Mulheres migrantes, afro-americanas, pobres, organizadas em diferentes instituições religiosas e culturais que reconstruíram as cidades no período entre a guerra civil e a primeira guerra mundial.


LEONIE SANDERCOCK (1949) - planejadora urbana australiana, critica a ausência de uma visão de gênero na teoria do urbanismo em: ‘A Gender Agenda: New Directions for Planning’ (1992) com ANN FORSYTH. Propôs um modelo radical de cidade pós-moderna, que pôs em evidência as experiências de grupos oprimidos. Nos livros ‘Towards Cosmopolis I: Planning for Multicultural Cities’ (1998) e ‘Cosmopolis II: Mongrel Cities in the 21st Century’ (2003) fala da utopia de uma cosmópolis baseada na diversidade de influências, dentre as quais o feminismo, numa ruptura epistemológica com o urbanismo tradicional.Suas propostas radicais e insurgentes continuam sendo transgressoras nos dias de hoje.


MATRIX FEMINIST DESIGN CO-OPERATIVE - cooperativa criada por um grupo de umas 20 mulheres em 1980 em Londres, pioneiras na abordagem feminista na arquitetura. O uso da palavra feminista na sua denominação causou debate na época. Seu trabalho analisava as relações entre as mulheres e seu entorno, mas também a relação entre elas e o exercício do projeto arquitetônico, numa estrutura não hierárquica. No livro ‘Making Space: Women and the Man Made Environment’ (1984) criticaram o modelo de desenho urbano existente, visibilizando o trabalho doméstico como trabalho. Trabalhavam no desenho de projetos sociais, oferecendo assessoria técnica, desenvolveram métodos para promover a participação e o empoderamento das mulheres. No entanto, a atuação do grupo parou nos anos 90 - talvez em função das políticas neoliberais de M. Thatcher.


CLARA GREED (1948) - acadêmica e ativista inglesa, publicou ‘Women and Planning: Creating Gendered Realities’ em 1994. Defende a importância dos banheiros públicos no contexto do desenho urbano, equipamento que considera essencial para a vida das pessoas, em particular das mulheres. Discute a prática do urbanismo que considera masculinizada em todas as vertentes: quem exerce e executa, quem e como gestiona, que olhar projeta e os temas que prioriza.


MARION ROBERTS (1951) - autora britânica, destaca-se por dar visibilidade à face noturna do urbanismo desde uma perspectiva de gênero, tema pouco investigado. Publicou ‘Living in a man-made world: Gender assumptions in modern housing design’ (1991).


RED EUROFEM (1994) - outra iniciativa coletiva pioneira na Europa no urbanismo com perspectiva de gênero. Já na década de 80 um grupo de mulheres nórdicas começou a se mobilizar a favor da conciliação laboral e familiar, e propuseram um novo conceito de vida cotidiana, relatado em ‘Experiences of the EUROFEM: Gender and Human Settlements Network' (2000). Desenvolveram um modelo para criação de infraestrutura de apoio à vida cotidiana nos bairros que integrava serviços, trabalho e cuidado de maneira respeitosa ao meio ambiente.


LIISA HORELLI - psicóloga ambiental finlandesa, participou da EUROFEM, seu trabalho traz uma leitura do espaço desde a psicologia que amplia a visão para além da arquitetura e do urbanismo. Jan Gehl, que embora tenha alcançado grande notoriedade internacional, expõe coisas bastante parecidas mas não aborda a perspectiva de gênero.


DORIS DAMYANOVIC - professora e planejadora urbana austríaca, ela e sua equipe, desde os anos 2000, têm trabalhado principalmente pela incorporação da perspectiva de gênero no planejamento urbano e territorial. Publicou em conjunto com BARBARA ZIBELL e outras, Gendered Approaches to Spatial Development in Europe’ (2000).


ANA FALÚ (1947) - arquiteta argentina e ativista social, trabalha em rede há 30 anos para introduzir na agenda das agências internacionais as problemáticas que afetam as mulheres e as meninas nas cidades, principalmente relacionadas à violência e segurança. Coordenadora da Red Mujer y Habitat de América Latina (desde 1989). A rede é precursora no âmbito lationamenricano na análise do espaço público desde a perspectiva de direito à cidade e na sistematização de metodologias para diagnóstico sobre segurança nos espaços cotidianos dos bairros, experiência descrita em ‘Mujeres en la Ciudad: de Violencias y Derechos’ (2009).


LOURDES GÀRCIA VÁZQUES (1946) - arquiteta e professora universitária mexicana, referência na aplicação do feminismo popular na arquitetura e no urbanismo, particularmente em projetos habitacionais e planos de bairros. Questiona a visão elitista da arquitetura, atuando numa perspectiva feminista e decolonial, para que comunidades indígenas e operarias passem a ser atores da mudança.


ANNA BOFILL (1944) - arquiteta e compositora espanhola, em sua conferência ‘Mujer y arquitectura’ durante as Primeiras Jornadas de Feministas Independentes (tradução nossa) de 1980 em Barcelona, lançou um olhar diferente da mulher ao entorno, pondo em pauta a relação entre estrutura patriarcal e a forma das cidades. Estas jornadas foram o ponto de partida para reflexões que se estenderam pela Espanha. Em 1996, com ISABEL SEGURA, publicou ‘El llibre blanc: les dones i la cuitat’ com recomendações para transformar as cidades catalãs desde a perspectiva de gênero.


TERESA DEL VALLE (1937) - antropóloga espanhola, sua obra ‘Andamios para una nueva ciudad: lecturas desde la antropología’ (1997) trata da multiplicidade de espaços que condicionam a relação entre mulher e cidade.


INÉS SÁNCHEZ DE MADARIAGA (1963) - arquiteta espanhola, trabalha desde os anos noventa para introduzir a perspectiva de gênero no urbanismo. O livro publicado em 2004 em parceria com o Instituto Andaluz da Mulher, intitulado ‘Urbanismo con perspectiva de género’ é uma das primeiras compilações de conceitos chave e experiências.


Esta revisão da genealogia feita pelo Coletivo Ponto 6 mostra que o tema já acumula mais de quarenta anos de teoria e prática, tanto na academia quanto em coletivos urbanos, ainda que as autoras reconhecem que existe uma maior produção teórica que aplicação empírica do urbanismo.



Referências:


Col.lectiu Punt 6: Ciocoletto, A. et al (Org.). Urbanismo Feminista: Por una transformación radical de los espacios de vida, Espanha: Ed. Virus, 2019.



Crédito da Imagem:

Laura Baccarin


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