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Foto do escritorGeisa Bugs

Em busca da equidade de gênero na coleta e análise de dados

Atualizado: 30 de jul. de 2021


Mapa ‘Onde você já vivenciou situações de assédio nos seus deslocamentos? Rumbora se Amostrar.




Organismos internacionais como o Banco Mundial têm noticiado a ausência de dados desagregados sobre os grupos mais vulneráveis, como mulheres, idosos e a população LGBTQIA+, o que leva formuladores de políticas públicas, não raro, a terem uma imagem incompleta da realidade. Para as autoras do livro Data Feminism (D’Ignazio e Klein, 2018) - um livro sobre poder na ciência de dados - isso é consequência direta da falta de interesse em atender as demandas desses públicos, mas também resultado de processos de elaboração de pesquisas feitos por humanos e, assim, necessariamente imperfeitos, que precisam parar de serem considerados neutros.


A dificuldade de coletar e análisar dados baseados em sexo e gênero ocorre em várias disciplinas. Muitas vezes, quando existem, estes dados não são considerados (Heidari et al, 2016). Recentemente, no webinar ‘Equidade de sexo e gênero em pesquisa e publicação’, a Dra. Shirin Heidari expos como as diferenças de sexo e gênero são frequentemente negligenciadas em pesquisas cientificas, seja na implantação ou na publicação, o que limita as generalizações dos resultados e suas aplicações. Para ela, a sub-representação das mulheres nas pesquisas científicas pode resultar em consequências bastante adversas, como em casos de tratamentos médicos inadequados. Heidari et al (2016) apresentam um checklist para pesquisas com perspectiva de gênero.


Uma proposta equitativa deve ir além da simples desagregação de dados de acordo com o sexo, e questionar as relações de gênero subjacentes que são refletidas nos dados. Os números não falam sozinhos, eles necessitam de pessoas que estejam dispostas a entendê-los e também a ouvi-los, destacam D’Ignazio e Klein (2018). Elas clamam para que projetos feministas conectem os dados às suas fontes, apontando os vieses, que podem estar embutidos em todas as etapas, e as diferenças de poder em seus ambientes de coleta que podem obscurecer seu significado.


O Feminismo de Dados (em tradução livre) propõe uma nova abordagem para a ciência de dados, colocando em pauta discussões sobre a coleta de dados, os objetivos do trabalho e as decisões que são tomadas ao longo do caminho. É uma forma de pensar sobre os dados e sua comunicação que é informada pela experiência direta, pelo compromisso com a ação e pelas ideias associadas ao pensamento feminista interseccional. A interseccionalidade chama a atenção para a complexidade de análises sociais com categorias e identidades que não são imóveis e que podem ter diferentes interpretações segundo o cenário e o contexto (Ciocoletto et al, 2019).


Pode-se citar como exemplo de levantamento de dados com recorte de gênero o projeto Rumbora se Amostrar. Ciente das diferenças nos padrões de deslocamento e almejando compreender as experiências das mulheres ao se deslocarem na cidade de São Luís, o projeto de iniciativa da sociedade civil aplicou um questionário específico sobre a demanda potencial de mulheres para uso da bicicleta. A pesquisa propôs ainda um bloco específico de perguntas intitulado ‘Chega de Assédio’, na tentativa de dar visibilidade à questão dos assédios ocorridos nos diversos espaços públicos percorridos, em especial nas ruas e no transporte público. A utilidade destes dados não se limita à geração de políticas de mobilidade. Eles podem propiciar ações de monitoramento e prevenção na área de segurança, para redução destes casos e o consequente aumento da segurança no uso desse modal. A visibilidade dos casos pode ter também um caráter informativo ou educativo (Bugs et al, 2020).


Trata-se, portanto, de um tema de debate muito importante na atualidade, tendo em vista que vivenciamos o processo de transformar diversos fenômenos do mundo em informação digital. As decisões estão sendo cada vez mais orientadas por sistemas automatizados que filtram grandes quantidades de dados (big data, machine learning, inteligência artificial...). Estas práticas, métodos e ferramentas podem amplificar as desigualdades se não levarmos em conta, entendermos e demonstrarmos como o poder e o privilégio operam (D’Ignazio e Klein, 2018).


Referências:

Bugs, G. T.; Isolan, F. B.; Rocha, K. R. Levantamento colaborativo de dados mediado por plataforma digital. V!RUS, São Carlos, n. 21, 2020. [online]. Disponível em: <http://www.nomads.usp.br/virus/virus21/?sec=4&item=12&lang=pt>. Acesso em: 16 Jul. 2021.

Ciocoletto, A. et al (Org.). Urbanismo Feminista: Por una transformación radical de los espacios de vida, Espanha: Ed. Virus, 2019.


D’Ignazio C, Klein L. In: Data Feminism [Internet]. 2018. Disponível em: <https://mitpressonpubpub.mitpress.mit.edu/6e1g6bgg>. Acesso em: 16 Jul. 2021.


Heidari, S., Babor, T.F., De Castro, P. et al. Sex and Gender Equity in Research: rationale for the SAGER guidelines and recommended use. Research Integrity and Peer Review, 2, 2016.


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