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Foto do escritorGeisa Bugs

Cidade inclusiva e urbanismo feminista


Ciocoletto (2014).


Uma cidade inclusiva promove o crescimento com equidade. A nova agenda urbana da ONU desafia cidades a se tornarem mais inclusivas e sustentáveis (FEITEN, 2018), uma vez que, de acordo com Velázquez (2012), há uma necessidade urgente de se mudar os critérios do urbanismo atual para responder a sociedade e a situação global cada vez mais complexas.


O desafio que o ideal da cidade inclusiva impõe aos arquitetos e urbanistas é o de encontrar meios de gerar compromisso social entre as políticas neoliberais e as comunidades que reclamam protagonismo na construção da cidade como espaço coletivo, capaz de satisfazer as necessidades básicas, independentemente das diferenças culturais, de gênero, idade, status econômico ou social, segundo Marques e Rasteiro (2018).


Conforme Janes Jacobs (2009 [1961]) já mencionara, a constituição de um espaço público de qualidade se dá, fundamentalmente, a partir da diversidade de usos com capacidade de atrair gente diferente o tempo todo. Este apresenta-se como a certeza de que a cidade não seja o resultado do agrupamento entre iguais, de comunidades homogêneas e intolerantes. Pensar a cidade a partir desta gênese conforma uma série de escolhas que enquadrem todos os grupos considerados excluídos (VIANA et. al., 2018).


O urbanismo é a disciplina que se encarrega dos assentamentos humanos e do conjunto de técnicas que se utilizam para a intervenção urbana. Via de regra, nas décadas anteriores, assumiu um papel de ferramenta útil para a criação de negócios, mas profundamente inadequada para atender às necessidades de uma sociedade díspar (VELÁSQUEZ, 2012). Foi considerado neutro e buscava a eficiência para um cidadão padrão. Mas esse urbanismo para “todos”, ao “eleger” um cidadão de padrão universal, responde a interesses particulares e invisibiliza a diversidade de experiências (CIOCOLETTO et. al., 2019). Portanto, faz-se necessário incluir no campo de atuação do urbanismo os desafios da inclusão e da equidade. Uma das questões em pauta, neste contexto, é a maneira pela qual as cidades são abordadas quanto à temática de gênero.


Em específico, o urbanismo feminista advoga mudanças de paradigmas para que essas plataformas se consolidem (MUXI, 2019). O feminismo promove a igualdade, a empatia e a sororidade, além de outros valores que clamam por olhar e entender as necessidades das pessoas sem hierarquias. Muxi (2019), ao afirmar que a vida nas cidades não é igual para todas as pessoas, questiona: a quem beneficia a estrutura e o desenho das nossas cidades? Na visão da autora, os espaços da cidade atual são cenários para desigualdades, fruto de um sistema patriarcal, capitalista, racista e colonial que a própria configuração e gestão urbana reproduzem, perpetuam e legitimam.


O urbanismo feminista situa a vida cotidiana no centro das decisões urbanas. Para tal, a rede de espaços públicos não é projetada levando em conta apenas a adequação ao sistema viário e seu horário de funcionamento é estendido; a cidade é prioritariamente caminhável e ciclável, atendendo a todas as idades; o contato com a natureza é presente mesmo nos espaços urbanos congestionados; há espaços de emprego e dinamismo econômico em todos os bairros, sem áreas monofuncionais; e a construção da cidade é coletiva com mulheres atuando efetivamente no governo; dentre outros aspectos importantes para o alargamento da qualidade da vida cotidiana (VELÁSQUEZ, 2012; CIOCOLETTO, 2014; VALDIVIA, 2018).


Assim, o urbanismo feminista não pretende apenas analisar as diferenças, mas erradicar as desigualdades, reclama a sustentabilidade da vida em primeiro lugar - “uma ideia tão simples mas tão radical de pôr a vida das pessoas no centro das decisões urbanas” (CIOCOLETTO et. al., 2019, p. 22, tradução nossa). Em resumo, almeja deixar de excluir, de privilegiar alguns em detrimento de outros, e, neste sentido, é inclusivo, pois representa melhorias para todos que vivem e compartilham a cidade.


Imagem: Ciocoletto (2014)


Referências:


CIOCOLETTO, A. Espacios para la vida cotidiana. Auditoria de calidad urbana con perspectiva de género. Col.lectiu Punt 6, Barcelona, 2014. Disponível em: <http://www.punt6.org/wp-content/uploads/2016/08/EspaciosParalaVidaCotidiana.pdf>. Acesso em: 13 de maio de 2021.


CIOCOLETTO, A. et. al. Urbanismo Feminista: Por una transformación radical de los espacios de vida. Editora Virus, Espanha, 2019.

FEITEN, P. Nova Agenda Urbana da ONU desafia cidades a se tornar mais inclusivas e sustentáveis. Site FNA. Disponível em: <http://www.fna.org.br/2018/08/16/nova-agenda-urbana-da-onu-desafia-cidades-a-setor-tornar-mais-inclusivas-e-sustentaveis/>. Acesso em: 13 de maio de 2021.

JACOBS, J. Morte e vida de grandes cidades. 2ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2009.


MARQUES, C. A.; RASTEIRO, D. M. S. Aprender a planear a cidade inclusiva. Cadernos de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo, 18, p. 141-154, 2018.


MUXI, Z. In: Ciocoletto, A. et. al. (Org.). Urbanismo Feminista: Por una transformación radical de los espacios de vida. Prólogo. Espanha, 2019.


VALDIVIA, B. Del urbanismo androcéntrico a la ciudad cuidadora. Hábitat y Sociedad, n. 11, p. 65-84, 2018. Disponível em: <http://dx.doi.org/10.12795/HabitatySociedad.2018.i11.05>. Acesso em: 13 de maio de 2021.


VELÁZQUEZ. I. Historia del uso del espacio público. Género y Urbanismo en la actualidad. In Servicio Central de Publicaciones del Gobierno V

asco. Conclusiones del seminario urbanismo inclusivo: las calles tienen género, 19-21, 2012. Disponível em: <https://www.garraioak.ejgv.euskadi.eus/r41-430/es/contenidos/evento/urbanismo_inclusivo/es_urbincl/adjuntos/seminario_es.pdf>. Acesso em: 13 de maio de 2021.


VIANA, A. M et al. Mapeamento da mobilidade cotidiana de cinco mulheres na cidade de Porto Alegre. Anais do Encontro Internacional Cidade, Contemporaneidade e Morfologia Urbana. Pelotas, v. 1. p. 201-220, 2018.



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